Para repatriar o bebê, policiais federais brasileiras permaneceram alguns dias com contato e cuidados com o bebê em Portugal juntamente com a família acolhedora portuguesa.
A pequena Pérola, uma bebê brasileira vítima de tráfico internacional, finalmente retornou ao Brasil nesta segunda-feira (24) após uma complexa operação conjunta entre a Polícia Federal brasileira e a Polícia Judiciária Portuguesa. O caso, que se desenrolou ao longo de 16 meses, revela uma rede criminosa que aproveitou brechas no sistema para tentar legalizar a retirada ilegal de crianças do país.
Tudo começou em outubro de 2023, quando um empresário português, identificado como Márcio Mendes Rocha, chegou ao Brasil alegando negócios. Dias depois, em 28 de outubro, nascia na Santa Casa de Valinhos (SP) uma menina, filha de uma jovem supostamente de Marabá (PA) que logo deixou a cidade após o parto.
Com a ajuda de uma brasileira que se apresentava alternadamente como secretária ou irmã, Márcio registrou a bebê como sua filha e, em 30 de outubro, pediu a guarda unilateral na Justiça – um movimento estratégico para conseguir retirar a criança do país sem autorização da mãe biológica.
Rede criminosa
As investigações revelaram uma operação meticulosa:
- Uso de dois endereços falsos (Valinhos e Itatiba) para registros distintos;
- Envolvimento de um escritório de advocacia de Itatiba nos processos de guarda;
- Emissão rápida de passaporte para a bebê em 1º de novembro;
- Concessão judicial da guarda em 15 de novembro.
Em 16 de novembro, Márcio deixou o Brasil levando a recém-nascida para Portugal. Enquanto isso, ele já preparava o golpe seguinte: em 21 de novembro nasceu um menino, também registrado como seu filho, para quem ele pediu guarda em 24 de novembro.
Denúncia e investigação
A intervenção dos funcionários do hospital foi crucial para desbaratar o esquema. A promotora Aline Moraes destacou: “Eles notaram a irregularidade quando o mesmo homem apareceu como pai de duas crianças em um mês, de mães diferentes, sem qualquer vínculo com a cidade“.

A Polícia Federal foi acionada em 30 de novembro e agiu rapidamente:
- 01/dez: pedido de mandados judiciais;
- 04/dez: prisão de Márcio quando tentava fugir com o segundo bebê;
- Cumprimento de quatro mandados contra a intermediária e advogadas.
Enquanto isso, em Portugal, a Polícia Judiciária localizou a primeira bebê em 16 de dezembro de 2023 na cidade de Valongo, região do Porto. A criança, então com 38 dias, estava com o marido de Márcio e foi colocada sob os cuidados de uma família acolhedora portuguesa.
Durante interrogatório, Márcio alegou que pretendia adotar as crianças, já que é casado com um homem. A delegada Beraquet Costa, no entanto, foi enfática: “a intenção não muda o fato de que documentos foram falsificados e um crime internacional foi cometido”.
Operação Pérola
Batizada de Operação Pérola, a repatriação foi conduzida com extremo cuidado. Agentes da PF brasileira passaram dias em Portugal estabelecendo vínculo com a bebê para garantir uma transição tranquila.
Como destacou a PF: “Mantivemos contato entre as famílias acolhedoras de ambos os países para preservar o bem-estar emocional da criança“.
Agora de volta ao Brasil, a menina foi encaminhada a uma instituição de acolhimento familiar em Valinhos. As investigações continuam para:
- Apurar o papel exato da intermediária brasileira;
- Investigar a atuação das advogadas envolvidas;
- Localizar as mães biológicas das crianças.